sábado, 11 de abril de 2009

Artigo da Semana - Seca: Uma calamidade previsível?


"Quem quer fazer alguma coisa encontra um meio.
Quem não quer fazer nada, encontra uma desculpa.” Roberto Shinyashiki.

Depois de longos oito meses voltou a chover no nordeste baiano. Chuvas ainda esparsas. Como diz o nosso homem do campo: são “chuvas de manga”, ou seja, chove em alguns lugares, em outros não. A sabedoria popular diz que chuva na sexta feira santa é um bom prenuncio de inverno bom e com safra.
A mídia tem divulgado nas últimas semanas o intenso calor na nossa região, no vizinho estado de Sergipe e no sertão de Alagoas. Lembro-me de quantas vezes já vi essa cena: plantações perdidas, animais mortos de fome e sede, famílias e mais famílias sem ter o que comer e mendigando por alguns poucos litros d’água que chegam de tempos em tempos nos carros pipa. Isso quando tem carro pipa. Dezenas de milhares de homens e mulheres migram para as cidades médias e grandes centros para fugir do flagelo da seca. Sonhos são destruídos. Famílias são desestruturadas. Só resta a terra abandonada, em processo de desertificação.

Estudos científicos indicam que com o aquecimento global as mudanças climáticas afetarão ainda mais o semi-árido nordestino. Nesta situação, a temperatura média para o Nordeste deve subir até 5°C nos próximos 50 anos. Os ciclos de seca serão mais intensos e freqüentes. As áreas em processo de desertificação irão mais que triplicar de tamanho. O dado novo e perverso é que o fenômeno agravará a tendência de migração da região da população mais carente. Vilas e povoados podem desaparecer. As médias e grandes cidades terão agravados os seus problemas estruturais de habitação, saneamento, saúde publica e educação. O impacto econômico negativo alargará o abismo entre o nordeste e o sul e sudeste.
Não vamos nos enganar: o Nordeste é hoje responsável por 14 % do PIB nacional com mais de R$ 300 bilhões/ano e tem direito a uma infra-estrutura que garanta um mínimo de cidadania à sua população. Não estou falando em novidades ou coisas utópicas, mas de tecnologias e soluções conhecidas há muito tempo. Não precisamos de obras faraônicas, megalomaníacas, mas temos condições de possuir estrutura hídrica de qualidade, tanto para consumo humano como para produção, através do uso racional de poços artesianos, açudes, barragens, perenização de rios temporários, adutoras, cisternas, sistemas simplificados de abastecimento e produção, para dar ao cidadão um mínimo de segurança e proteção. Água é vida. Sem água não há esperança.
Chega de ver nossos irmãos fugirem da seca para se tornarem cidadãos e cidadãs de segunda categoria nas terras estranhas. Sem estudo ou qualificação para enfrentar o mercado de trabalho, os homens, em sua maioria, vivem de sub-empregos ou tornam-se alvos fáceis da bandidagem e do crime. Quase sempre, as mulheres viram “secretárias do lar” ou prostitutas. As que ficaram no sertão tornam-se viúvas de maridos vivos. São poucos os que conseguem vencer na cidade grande.


Secas ocorrem em diversas partes do planeta. Em alguns lugares do hemisfério norte só é possível cultivar a terra durante três meses por ano, pois por nove meses a terra fica coberta de gelo. E lá eles conseguem viver e produzir. Naqueles países as necessidades das pessoas comuns fazem parte da prioridade do Estado. O povo tem e recebe a atenção devida.
Há mais de um século, o Rei D. Pedro II, ao visitar o nordeste e conhecer de perto o flagelo da seca, anunciou que gastaria até a última jóia da sua coroa para acabar com a seca. Ficou só no discurso. De lá pra cá, pouco se fez. A dor do sertanejo pobre, seu sofrimento, a vida Severina, a tragédia de vidas destruídas, nada disso tem sido prioridade.
Sei que nunca iremos acabar com a seca do Nordeste, pois ela é um fenômeno natural e cíclico. O que precisamos é aprender a conviver de forma produtiva com ela: armazenar as águas das chuvas para os períodos de estiagem, preservar a fauna e a flora da caatinga, recuperar as áreas degradadas, reflorestar as matas ciliares, morros e cumes de serras. Enfim, respeitar os limites impostos pela natureza em busca da sustentabilidade e da convivência do homem com o bioma caatinga.

Fotos: Google

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